Todas as coisas servem, para

“Todas as coisas cujos valores podem ser
disputados no cuspe à distância
servem para poesia

O homem que possui um pente
e uma árvore
serve para poesia

Terreno de 10×20, sujo de mato – os que
nele gorjeiam: detritos semoventes, latas
servem para poesia.”

Matéria de poesia – Manoel de Barros

O poeta sul-matrogrossense conseguia transformar tudo em poesia, de um chevrolé gosmento a uma andorinha de junho, tudo era matéria para se buscar a beleza e, nessa busca, deixar a seus futuros leitores pegadas a lhes guiar por esse mundo hostil.

O jornalismo tem seguido o princípio do poeta e transformado tudo em matéria de [in]formação. Porém falta a busca pelo belo. Falta a vontade do acerto. A fome do descobrir falta, e é sobrepujada pela vontade do enganar.

Essa semana foi composta de sete dias de recriação do mundo, começando com a prisão dos hackers-russos de Araraquara e terminando com o aviãozinho do PCdoB emitindo uma nota oficial dizendo que o hacker é patriota; roubou as informações de mais de mil membros da esfera pública brasileira mas, para não sujar as mãos, não vendeu as informações. Deu.

Esse sábado merece ser “o dia do descanso” como há muito não se via. O mundo distópico criado por Glenn Greenwald & cia., onde a segurança dos dados não importa, onde a justiça – ou o crime – não importam, onde o meio de obtenção de informação não importa, esse mundo distorcido onde tudo é “matéria de jornalismo”… esse mundo foi recriado pela PF e nem foi preciso trabalhar seis dias para descansar no sétimo. Em apenas cinco dias o mundo de fantasias do TheIntercept foi desconstruído e, no sexto dia, Sérgio Moro deu sua cartada final mostrando que, informações pessoais obtidas de forma ilegal não podem ser utilizadas e, assim, anunciou que nem mesmo ele irá utilizar os dados das vítimas, entregues pelo “Vermelho” à PF na terça-feira. Os dados ilegais serão descartados.

Com essa lição, Sérgio Moro mostra o caminho correto para se chegar ao fim correto. Ficou claro agora, para todos os que tem ouvidos para ouvir que, no jornalismo, diferente do que acontece na poesia, nem todas as coisas cujos valores podem ser disputados no cuspe à distância, servem.

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