Cantos sobre um olhar acidental.
Édouard Manet – Un bar aux Folies-Bergère (1882).
CANTO I
Um olhar, com o cheiro do momento antes da chuva cair.
Um olhar, macio como o toque da lua nas nuvens.
Mas, ao mesmo tempo, eletrizante como o beijo de dois raios.
Nossos olhares com aquele toque,
Aquele gesto sem querer, mas que,
Exala vontade como um vulcão,
E abafa o zumbido da multidão.
Um olhar, com o cheiro do momento antes da chuva cair.
Um olhar, macio como o toque da lua nas nuvens.
Mas, ao mesmo tempo, eletrizante como o beijo de dois raios.
Num bar de esquina, entre uma gargalhada
E outra, o meu olhar não se fixa em mais nada.
Só em teu olhar bradante com cheiro palatável
E suas pétalas de um pôr do sol de verão venerável.
Um olhar, com o cheiro do momento antes da chuva cair.
Um olhar, macio como o toque da lua nas nuvens.
Mas, ao mesmo tempo, eletrizante como o beijo de dois raios.
Tu foste invisível durante toda a vida,
Não mais! Agora, neste eterno instante,
Eu te vejo, te vejo em tudo, inteiramente!
Como uma fusão nuclear, uma união mítica.
Um olhar, com o cheiro do momento antes da chuva cair.
Um olhar, macio como o toque da lua nas nuvens.
Mas, ao mesmo tempo, eletrizante como o beijo de dois raios.
Foste, antes deste beijo dos nossos olhos,
Apenas parte do cenário na história de outros,
Mas hoje, tudo muda! Verás a ti nos espelhos,
E não apenas um vulto, não verás apenas rostos.
Um olhar, com o cheiro do momento antes da chuva cair.
Um olhar, macio como o toque da lua nas nuvens.
Mas, ao mesmo tempo, eletrizante como o beijo de dois raios.
Tanto sonhos, tantas desilusões, paixões
Sem razões, sensações que nunca terias.
Mas agora serás tudo que nunca serias,
Aqui, nessa dança dos nossos corações…
CANTO II
Dessa dança somos os personagens,
Impetuosa, como a dança dos trens,
Faiscante, como a dança das ferragens,
Flutuante, como a dança das fuligens,
Fugaz, como a dança das paisagens,
Teatral, como a dança das imagens.
Dessa dança somos os personagens,
Mágica, como a dança dos selvagens,
Mítica, como a dança das origens,
Feérica, como a dança das miragens,
Delicada, como a dança das folhagens,
Macia, como a dança das nuvens,
Dessa dança somos os personagens,
Inocente, como a dança das virgens,
Folgaz, como a dança das bobagens.
Lúbrica, como a dança das margens,
Cálida, como a dança dos lumens,
Dessa dança somos os personagens.
CANTO III
Meu peito aquece
nesse sorriso molhado.
Meu peito padece
nesse cheiro iluminado.
Teus pés de mármore angelical,
o brilho na luz do luar é meu farol;
rosados, são pétalas de pôr do sol,
macios como a alma do mar brumal.
Bochechas, que são as próprias nuvens
de um verão adolescente e feérico!
Seus lábios, escultura da Beleza…
Seu cabelo, fusão das belas paisagens,
Seu olhar, portal de um mundo mágico!
Sua alma, personificação da Pureza…